Os segredos do sucesso do Starbucks

Por Marcio Kroehn

Em entrevista ao grupo controlador da Azulis, o empreendedor Howard Schultz, que anunciou sua candidatura à Presidência dos Estados Unidos em 2020, revela o que fez da rede de cafeterias um dos negócios mais rentáveis e copiados do mundo

Howard Schultz decidiu deixar o comando do Starbucks, a rede de cafeterias com mais de 29,3 mil lojas globais e receita de, aproximadamente, US$ 25 bilhões para realizar um sonho: lançar sua candidatura independente à Presidência dos Estados Unidos em 2020. Sua proposta de campanha é “reimaginar a América”.

Howard_Schultz_Starbucks_Getty

“É tempo nos Estados Unidos em que todos temos de reconhecer que existe uma falta de liderança verdadeira no governo. Nós como cidadãos, líderes de negócios e empresas precisamos nos engajar muito mais. É o momento de perguntar para nós mesmos se estamos ficando velhos. Este é o momento em que a liderança é necessária”, disse Howard em entrevista a Ric Elias, CEO e fundador da Red Ventures, grupo controlador da Azulis, no podcast 3 Things.

Para quem pensa que essa ideia é apenas uma ilusão, a conversa com Elias mostra que reinvenção foi uma palavra bastante presente ao longo da vida de Howard, que começou na Xerox antes de se juntar ao Starbucks – entrou na empresa em 1982, quando a quarta loja seria inaugurada. Entre erros e acertos, ele sempre buscou propósitos em tudo o que fez. Nos momentos decisivos, seguiu seu coração. Para tentar chegar à Casa Branca, não será diferente.

Porém, mais do que uma discussão sobre a política americana, Howard fala sobre empreendedorismo e como construir uma empresa correta. Não a maior e talvez nem a melhor, mas aquela que consegue ir além do lucro. O ex-CEO do Starbucks divide muitos valores com quem está desenvolvendo o próprio negócio. É uma aula de gestão com toda a sinceridade e simplicidade de quem construir um império do café.

“Toda a companhia foi baseada na proposta de equilíbrio entre o lucro e a benevolência. O sucesso deve ser dividido”, afirmou Howard.

Acompanhe alguns trechos da entrevista:

DE ONDE VEIO A IDÉIA PARA O STARBUCKS?
Em 1983, o fundador do Starbucks me mandou para uma feira de negócios em Milão, na Itália. Todos os dias eu andava do hotel para o centro de convenções e via muitas cafeterias. Havia 3 ou 4 a cada quarteirão, em todas as ruas, em todos os lugares. Entrei nesses lugares e vi as pessoas, no mesmo horário, reconhecendo umas as outras. Aquilo chamou a minha atenção pelo senso de comunidade em torno de um café espresso. O Starbucks, naquele momento, era um pequeno negócio bem-sucedido de Seattle que só vendia café para levar para casa. Na volta da Itália, contei para o fundador que tinha visto o futuro. E perguntei o que ele iria fazer? Ele rejeitou a ideia e disse que isso não faria parte do negócio. Um ano e meio depois, o fundador disse que abriríamos a nossa loja número 5 e que me daria cerca de meio metro quadrado para ter uma cafeteria. Eu fiz e foi um tremendo sucesso. Mas ele odiou e disse que nunca mais abriria nenhuma outra. Então eu disse que sairia do Starbucks e seguiria o meu coração.

MAS O SR. MUDOU DE IDÉIA E DECIDIU COMPRAR O STARBUCKS, CERTO?
Saí para abrir a minha própria companhia. Sete meses depois, o Starbucks passou a ter problemas por causa de um concorrente de São Francisco chamado Peets. O fundador veio até mim e disse: “A boa notícia é que vou vender o Starbucks para você, por US$ 3,8 milhões, em agosto de 1986”. Respondi: “É fantástico, mas eu não tenho o dinheiro”. Então ele disse que me daria 90 dias de exclusividade para levantar o dinheiro. Muito rapidamente tentei levantar o dinheiro. Quando tinha a metade comigo, o fundador veio até mim e disse: “Como você está indo com o dinheiro?” Eu tenho US$ 2 milhões e estou confiante em ter todo o montante, mas ainda não tenho. Então ele falou: “tenho uma proposta de US$ 4 milhões em dinheiro, sem due dilligence; faça uma proposta pela empresa, porque um dos meus primeiros investidores quer ficar com a companhia”. Era um dos grandes titãs de Seattle, um Deus naquele momento, como eu poderia ficar frente a frente com ele?

COMO FOI A HISTÓRIA DA COMPRA DO STARBUCKS?
À noite, estava num jogo de basquete e contei a história para um amigo, que era um jovem advogado. Ele disse que eu deveria contar toda a história para um sócio do escritório dele. Sim, eu iria às 8 horas da manhã para ser apresentado ao sócio sênior da firma, que era o Bill Gates Sr (nota do Editor: pai do famoso Bill Gates, fundador da Microsoft). Então, eu disse a ele exatamente o que aconteceu e ele me fez duas perguntas:
– Você deixou qualquer coisa sobre essa história de fora?
– Não, eu disse.
– Howard, há alguma coisa nessa história que não seja verdade?
– Mr. Gates, tudo o que eu disse é 100% confiável.
– Então vamos dar uma volta, ele disse, nós vamos ver o homem.
Meu coração disparou, eu estava suando, eu não estava acreditando no que estava acontecendo ali. O Bill Gates Sr. tem 2 metros de altura e era uma grande figura de Seattle. E o Bill Gates Jr., sabe aquele Bill Gates?, ainda não era ninguém. Nós fomos para o escritório e Bill Gates Sr. disse para o fundador do Starbucks:
– Você deveria se envergonhar do que fez. E deixe-me dizer exatamente o que vai acontecer: Howard vai comprar a empresa e nós nunca mais vamos ouvir falar de você novamente. Você me entendeu?
O cara balançou a cabeça e não disse nada. Nós saímos do escritório e eu comecei a chorar no elevador. Eu disse: Mr. Gates, eu ainda preciso levantar mais dinheiro. Ele respondeu: eu vou ajudá-lo a levantar o dinheiro e meu filho e eu vamos ser investidores. Compramos a empresa e eu nunca mais vi o cara de novo.

QUAIS LIÇÕES O SR. TIROU DA HISTÓRIA DE CRESCIMENTO DO STARBUCKS?
Empreendimentos fortes têm cultura, valores e propósitos. Quando tínhamos 100 lojas, o sonho eram 1.000. Mas não tínhamos experiência para construir uma empresa muito maior naquele tempo. Então, temos de encontrar pessoas que tiveram essa experiência. Mas queríamos atrair um tipo de pessoa que viria para cá como as razões certas. Não começamos uma empresa para ficarmos ricos, mas para criar uma grande e duradoura empresa com pessoas de valor. Ela poderia ser pequena, média ou grande, mas elas vestiriam a camisa da empresa e abraçariam a ideia original de ter equilíbrio de lucro com benevolência, consciência social e partilhando o sucesso. Nem tudo deu certo, cometemos vários erros. Parte difícil é ficar de pé, corrigir-se e pedir desculpas. Ser transparente, autêntico e realmente confiável com as pessoas sobre a sua missão e o objetivo da organização.

QUE CONSELHOS O SR. TEM PARA EMPREENDEDORES COM SONHOS GRANDES?
Penso que é preciso ter coragem moral para desafiar o status quo e reconhecer que cada indústria está sendo desafiada, hoje, a traçar tendências. O resultado disso é auto renovação, reinvenção e fazer coisas para quebrar o vidro. Essa mentalidade funciona para um pequeno negócio que está começando ou um grande. É preciso mantar o DNA empreendedor, que é a fundação de uma companhia. Posso dizer metaforicamente: você não pode construir 100 lojas, nem sonhar com isso, sem uma fundação. Essa tem de ser construída para absorver todas essas novas histórias e todas essas novas tentativas de inovação e mudança, erro e falhas. Mas essa fundação não é baseada em tijolos e imóveis. Ela é baseada em amor, compaixão, empatia, compreensão. É isso o que constrói grandes empresas.