Medalhista olímpica deixa o Vale do Silício para empreender no Brasil

Por Maria Teresa Lazarini

Medalhista da Olimpíada Brasileira de Matemática (OBM) e da Olimpíada Internacional de Matemática (IMO), Deborah Alves estudou em Harvard e voltou para o Brasil para empreender na área de saúde

Hoje, ela é cofundadora e diretora de tecnologia da Cuidas, startup de atendimento médico familiar focada em empresas

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Desde a estreia do Brasil na Olimpíada Internacional de Matemática (IMO), em 1979, mais de 200 meninos participaram das competições para representar o País, mas apenas sete meninas estiveram presentes. A paulistana Deborah Alves, hoje com 26 anos, foi uma das que tiveram a chance de competir nas edições da IMO. Ela recebeu menção honrosa na edição de 2010 e uma medalha de bronze em 2011. Além de competir nas olimpíadas fora do Brasil, as diversas participações na Olimpíada Brasileira de Matemática (OBM) despertaram em Deborah o desejo de traçar voos internacionais.

Seu destino foi a prestigiada Universidade Harvard, onde estudou matemática e ciência da computação. Em seguida, ela foi trabalhar no Vale do Silício, o berço global da inovação, localizado na Califórnia. Para Deborah, essas experiências levavam a um lugar: o Brasil, mas dessa vez para empreender.

“Eu queria empreender e também tinha muita vontade de provocar um impacto no Brasil. Sei que faço muito mais diferença aqui do que nos EUA. Tem muito mais gente como eu lá do que aqui”, diz Deborah.

Em 2018, ela e dois sócios, João Vogel e Matheus Silva, que também estudaram nos Estados Unidos, lançaram a Cuidas, uma startup que oferece atendimento médico personalizado para empresas. A tese deles é que, com tecnologia, a Cuidas pode descomplicar e personalizar o atendimento no setor de saúde no Brasil, onde 75% da população não tem acesso a um plano privado. Com um modelo de negócios considerado inovador, a Cuidas chamou a atenção da Canary, um fundo de venture capital focado em startups brasileiras que têm mais de R$ 160 milhões para investir em ideias promissoras.

Em seu segundo ano de atuação, a Cuidas já atende clientes como Easy Carros, Livework, Benjamin e Mandalah. A companhia que deseja oferecer um atendimento médico familiar para seus funcionários deve assinar um plano mensal: para empresas com até 200 funcionários, o valor é de R$70 por pessoa. Acima deste número, a Cuidas avalia o perfil da empresa e estabelece um valor personalizado.

Com a assinatura, os colaboradores podem marcar atendimentos presenciais com profissionais ou tirar dúvidas online. Com uma equipe de mais de 10 médicos associados à Cuidas, o funcionário consegue solicitar e agendar o atendimento por meio de um aplicativo próprio. O próximo passo é disponibilizar o serviço de atendimento médico em outros estados: por enquanto, a startup atende somente a região metropolitana de São Paulo.

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Um negócio de impacto para o Brasil

A falta de identificação com a cultura norte-americana ajudou Deborah a voltar e empreender no Brasil. Na época, a cientista da computação já havia sido efetivada no Quora, plataforma de conhecimento com mais de 680 milhões de acessos por mês.

Analisando os riscos de largar a estabilidade conquistada no Vale do Silício, ela percebeu que os empecilhos eram mais o julgamento alheio do que os riscos do próprio empreendimento. Com a poupança que havia acumulado, Deborah tentaria empreender. Se não desse certo e o dinheiro acabasse, arranjaria um emprego e partiria para a próxima.

Apesar de vir ao Brasil com outra ideia de negócio, ela topou abraçar o projeto da Cuidas, que foi desenhado por Silva. Estudando sobre o mercado de saúde e trabalhando como consultor, ele percebeu como os brasileiros eram prejudicados por conta do mau atendimento na área de saúde. Com isso em mente, ele entrou em contato com Deborah e Vogel e propôs criar um produto de atendimento médico de atenção primária em que os pacientes fossem o alvo. Juntos, eles remodelaram o plano de negócios e chegaram ao formato atual da Cuidas, uma startup que atua no B2B (empresas para empresas).

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Dona do próprio negócio

Com mais de 20 funcionários fixos, Deborah comenta que, desde 2018, um dos maiores desafios da Cuidas é o recrutamento. Durante os primeiros passos da empresa, a dificuldade era conseguir um voto de confiança dos colaboradores para um negócio recém-criado. E engana-se quem pensa que a tarefa ficou mais fácil com o tempo. Ela cita como exemplo o obstáculo para contratar gente para o cargo de engenheiro de software, que é uma das profissões mais requisitadas no momento.

Diferentemente de um trabalho fixo e monótono, o dia a dia de Deborah como diretora de tecnologia da Cuidas envolve múltiplas tarefas e responsabilidades, desde liderar times a participar do recrutamento e planejar o crescimento da empresa. Apesar de ter trabalhado anteriormente em startups que carregam uma cultura disruptiva, a empreendedora fala que a rotina requer disposição.

“Para mim, a maior diferença em empreender é essa: a gente perde um pouco a estabilidade e passa a lidar com muita coisa diferente ao mesmo tempo”, diz Deborah.

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A olímpiada que desperta vocações

Criada em uma família de engenheiros, não faltaram incentivos para Deborah seguir carreira na área de Exatas. Aos 8 anos, ela tinha aulas extracurriculares de robótica. Com 9 anos, seu passatempo já era “brincar de programar”, fazendo templates de sites.

“Desde pequena, eu sempre gostei muito de matemática. Sempre tive contato com computação e essa parte tecnológica”, diz Deborah que, aos 11 anos, começou a disputar as competições da Olimpíada Brasileira de Matemática (OBM). “Foi na 6ª série que eu ganhei minha primeira medalha na OBM. Quando ganhei uma medalha de bronze, esse mundo das olimpíadas foi aberto para mim. A forma de pensar que eu aprendi na olimpíada eu carrego pra vida”, afirma ela.

Ganhando diversas das competições nacionais, Deborah começou a apostar nas competições internacionais, que, junto com as disputas da OBM, foram um fator decisivo para sua carreira fora do País. Marcelo Viana, que é diretor-geral do Instituto de Matemática Pura e Aplicada (IMPA), organização que realiza a OBM, ressalta a importância das olimpíadas no futuro profissional dos jovens brasileiros.

“As olimpíadas do conhecimento, particularmente no âmbito da matemática, podem ter um papel determinante na trajetória de vida de nossos jovens, despertando vocações, identificando talentos e propiciando oportunidades”, diz Viana, diretor-geral do IMPA.

Com o impulso das competições matemáticas, Deborah decidiu tentar estudar fora do País. Das cinco universidades que se inscreveu, ela foi aceita em quatro. “No meio do caminho das olimpíadas, vi que queria estudar nos EUA, porque estava começando a ficar mais conhecido o processo para entrar nas universidades americanas. Decidi estudar em Harvard, que foi onde fiz minha graduação em ciência da computação e matemática”, afirma Deborah, que fez estágios no Brasil e nos EUA durante a universidade.

Foi em Harvard que a semente do empreendedorismo foi plantada para Deborah. Conhecendo outros estudantes brasileiros na universidade, como João Vogel, Deborah participou da criação da BRASA, uma organização sem fins lucrativos que tem como objetivo unir e empoderar estudantes brasileiros fora do País. Assim como ela, eles também queriam voltar para o Brasil. Afinal, o desejo de mudar a realidade brasileira falou mais alto do que a estabilidade de um emprego fixo nos Estados Unidos.

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